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quarta-feira, 2 de janeiro de 2019
É um poema... apenas!
Aos Poetas
Miguel Torga
Somos nós As humanas cigarras! Nós, desde o tempo de Esopo conhecidos… Nós, Preguiçosos insetos perseguidos.
Somos nós os ridículos comparsas Da fábula burguesa da formiga. Nós, a tribo faminta de ciganos Que se abriga Ao luar. Nós, que nunca passamos, A passar!
Somos nós, e só nós podemos ter Asas sonoras. Asas que em certas horas Palpítam. Asas que morrem mas que ressuscitam Da seputura! E que da planura Da seara Erguem a um campo de maior altura A mão que só altura semeara.
Por isso a vós, Poetas, eu levanto A taça fraternal deste meu canto, E bebo em vossa honra o doce vinho Da amizade e da paz! Vinho que não é meu, Mas sim do mosto que a beleza traz!
E vos digo e conjuro que canteis! Que sejais menestréis Duma gesta de amor universal! Duma epopeia que não tenha reis, Mas homens de tamanho natural!
Miguel Torga
Do livro Odes – 4ª edição – edição do autor, s. d.